Resumo: Este ensaio desenterra a Guerra Mucker, o primeiro levante messiânico do Brasil moderno, ocorrido entre teuto-brasileiros em 1874 e deixado à impunidade, relegado à escória da história. O conflito fratricida teve como pano de fundo um expansionismo neocolonial que conectava a Europa à fronteira sul do país, refletindo também a dinâmica de racialização e a necropolítica das classes dominantes, assim como uma silenciada insurgência anticolonial de base: espaço-tempos e entrelaçamentos dos quais eu sou um descendente acidental. Embora amaldiçoado, um certo modo comunitário de cuidar de si mesmo e de seus entes queridos permaneceria vivo como um não-saber errante naquela paisagem sulina, manifestando o poder plástico da gente colonizada internamente. Ao dar atenção etnográfica a essa dimensão ahistórica, o ensaio delineia um outro lugar que desaloja o conhecido e possibilita capacidades distintas de sintonização e de contar histórias e, para os Mucker e seus descendentes, métodos alternativos de conceber o corpo e o mundo abertos ao Espírito da Natureza. O etnógrafo-contador-de-histórias é uma das muitas entidades que pulsam no palimpsesto poético-prismático de traços-daquilo-que-não-se-sabe, sempre prestes a se tornar outra coisa: um coletivo de copresenças que a práxis antropológica pode deixar apodrecer e continuar desaparecendo - como um modo de viver enxertado na natureza - ou que pode ser revivido por esses lampejos, mesmo sem linguagem.
Abstract: This essay unearths the Mucker War, the first messianic uprising in modern Brazil, which took place among German-Brazilians in 1874 and was left to impunity and relegated to the dustbin of history. The fratricidal conflict unfolded against the backdrop of a neo-colonial expansionism that connected Europe to the country's southern frontier, also reflecting the dynamics of racialization and the necropolitics of the ruling classes, as well as a silenced grassroots anti-colonial insurgency: spaces-times and entanglements of which I am an accidental descendant. Though cursed, a certain communal way of caring for oneself and one's loved ones remained alive in this southern landscape as a wandering non-knowledge, manifesting the plastic power of internally colonized people. By paying ethnographic attention to this non-historical dimension, the essay delineates another place that dislodges the known and makes possible different capacities for tuning in and storytelling, and, for the Mucker and their descendants, alternative ways of conceiving the body and the world open to the spirit of nature. The ethnographer-storyteller is one of the many entities that pulsate in the poetic-prismatic palimpsest of traces-of-what-one-does-not-know, always on the verge of becoming something else: a collective of co-presences that anthropological praxis can let rot and continue to vanish - like a way of life grafted onto nature - or that can be revived by these flashes, even without language.
Resumen: Este ensayo desentierra la Guerra Mucker, el primer levantamiento mesiánico del Brasil moderno, que tuvo lugar entre germano-brasileños en 1874 y quedó impune y relegado al basurero de la historia. El conflicto fratricida se desarrolló en el contexto de un expansionismo neocolonial que conectaba Europa con la frontera sur del país, reflejando también las dinámicas de racialización y la necropolítica de las clases dominantes, así como una insurgencia popular anticolonial silenciada: espacios-tiempos y enredos de los que soy descendiente accidental. Aunque maldita, cierta forma comunitaria de cuidar de uno mismo y de sus seres queridos permaneció viva en este paisaje meridional como un no-saber errante, manifestando el poder plástico de la gente internamente colonizada. Al prestar atención etnográfica a esta dimensión no histórica, el ensayo delinea otro lugar que desaloja lo conocido y posibilita distintas capacidades de sintonía y narración y, para los Mucker y sus descendientes, formas alternativas de concebir el cuerpo y el mundo abiertas al espíritu de la naturaleza. El etnógrafo-narrador es una de las muchas entidades que palpitan en el palimpsesto poético-prismático de huellas-de-lo-que-no-se-sabe, siempre a punto de convertirse en otra cosa: un colectivo de copresencias que la praxis antropológica puede dejar pudrir y seguir desvaneciéndose - como una forma de vida injertada en la naturaleza - o que puede ser revivido por estos destellos, incluso sin lenguaje.