RESUMO A rebelião tupinambá de 1617, liderada por um nativo conhecido como Amaro, foi um episódio decisivo na conquista das regiões do Maranhão e do Grão-Pará pelos portugueses. Mas muito pouco se sabe sobre um conflito que interrompeu a expansão da União Ibérica e exigiu a atenção irrestrita das autoridades peninsulares por cinco anos. A análise do episódio escrita pelo governador Bernardo Pereira de Berredo, na primeira metade do século XVIII, ainda é a única narrativa da revolta disponível (e reproduzida). Com base em material de arquivo, este artigo revela o viés da narrativa do governador, construída para legitimar a autoridade colonial, e propõe uma nova análise, na qual a agência dos rebeldes e a complexidade de suas ações são integralmente expostas.

ABSTRACT The 1617 Tupinambá rebellion, led by a native known as Amaro, was a decisive episode in the Portuguese conquest of the Maranhão and Grão Pará regions. However, very little is known about a conflict that halted the expansion of the Iberian Union and requested the peninsular authorities' full attention for five years. The rebellion's analysis written by Governor Bernardo Pereira de Berredo in the first half of the eighteenth century is still the only available (and reproduced) narrative on the uprising. Using archival material, this article unveils the bias of the governor's narrative, constructed to legitimize the colonial authority, and proposes a new analysis in which the rebels' agency and the complexity of their actions are fully exposed.

RESUMEN La rebelión tupinambá de 1617, liderada por un nativo conocido como Amaro, fue un episodio decisivo en el proceso de la conquista portuguesa de las regiones de Maranhão y Grão Pará. A pesar de ello, conocemos pocos detalles sobre este conflicto, que durante cinco años mantuvo en vilo a las autoridades de la Unión Ibérica y detuvo su expansión por el continente. De hecho, la versión construida por el gobernador Bernardo Pereira de Berredo en la primera mitad del siglo XVIII todavía es hoy la única narrativa disponible sobre la rebelión. A partir de documentación de archivo, este artículo demuestra la parcialidad de dicha narrativa, construida para legitimar la autoridad colonial, y propone un nuevo análisis en el que aumenta el protagonismo de los rebeldes y la complejidad de sus acciones.

En el mundo colonial americano existieron dos mitos relacionados con la insularidad de los territorios situados al norte y al sur del río Amazonas. Ambos mitos parecen encontrar su origen en el diálogo entre las expectativas medievales de los conquistadores y la compleja realidad de las sociedades amerindias al momento de la conquista. Por lo tanto, pueden leerse como documentos etnohistóricos y ser empleados en la elaboración de nuevas narrativas históricas. En este artículo proponemos que la fijación de la frontera colonial portuguesa sobre el bajo río Amazonas en el siglo XVII se debió, en parte, a la pre-existencia de una frontera amerindia en dicho espacio. Los ecos de esta frontera pueden escucharse a través de los mitos coloniales de la Isla Brasil y la Isla Guayana, que analizaremos con el objetivo de visibilizar la influencia nativa en los procesos de expansión de las potencias europeas.

In the American colonial world existed two myths about the insularity of the territories situated in the northern and southern shores of the Amazon River. Both myths seem to find their origin in the dialogue between the medieval expectations of the conquistadores and the complex reality of the Amerindian societies. For that reason, these colonial myths can be read as ethnohistorical sources and can be used in the construction of new historical narratives. This article proposes that the establishment of the Portuguese colonial frontier in the Delta and on the Lower Amazon during the XVIIth century was due, in part, to the pre-existence of an Amerindian frontier in the same regions. The echoes of this frontier can still be heard through the colonial myths of the Islands of Brazil and Guayana, which will be analyzed to make visible the native influence in the expansion processes of the European colonial powers.

No mundo colonial americano existiram dois mitos relacionados com a insularidade dos territórios situados ao norte e ao sul do rio Amazonas. Ambos os mitos parecem ter sua origem no diálogo entre as expectativas medievais dos conquistadores e a complexa realidade das sociedades ameríndias ao momento da conquista. Portanto, podem ser lidos como documentos etnohistóricos e ser empregados na elaboração de novas narrativas históricas. Neste artigo propõe-se que a fixação da fronteira colonial portuguesa sobre o baixo rio Amazonas, no século XVII, deveu-se, em parte, à preexistência de uma fronteira ameríndia em dito espaço. Os ecos dessa fronteira podem ser ouvidos por meio dos mitos coloniais da Ilha Brasil e a Ilha Guayana, que analisamos aqui com o objetivo de visibilizar a influência nativa nos processos de expansão das potências europeias.