Resumo: A principal crítica do internismo a teorias externistas é que elas parecem fazer o conhecimento o resultado de processos que permanecem inacessíveis ao sujeito. Epistemologias externistas buscaram acomodar esta exigência, como é o caso da epistemologia de Sosa. A incorporação das exigências internistas não se faz sem tensões - no caso de Sosa, os mecanismos reflexivos podem ser inacessíveis ao sujeito. Na medida em que buscamos compreender como podemos conhecer e refletir sobre nossas próprias crenças, encontramos mecanismos externos ao sujeito que não podem ser internalizados: a dinâmica conversacional e o conhecimento científico dos mecanismos de funcionamento da cognição. A externalização do saber se estende para o conhecimento cientifico de maneira muito ampla. Uma pessoa que só tomasse como verdadeiro aquilo que pode provar (ou mesmo que pode compreender) seria alguém que recusaria boa parte do saber humano. Para todo leigo - isto é, para todo mundo, num ou noutro domínio -, assumir o que é produzido pela cultura é tomar como verdadeiras crenças cujo conteúdo resta opaco. Como exige um internista, o funcionamento interacional da razão não envolve mecanismos cegos à perspectiva do sujeito e não conceitualizados, mas, ao contrário, leva precisamente à articulação e à tomada de consciência das teses apresentadas. Este conhecimento não pode, contudo, ser internalizado. A externalização do conhecimento é um traço profundo do conhecimento e, mais geralmente, da cultura humana. No contexto de uma teoria evolutiva da cultura, muitos autores defendem, de diferentes modos, que a cultura humana é essencialmente social. O que talvez não seja tão usual seja conectar teorias mais gerais da evolução da cultura com preocupações tradicionais da epistemologia. Espero mostrar que este é um caminho frutífero.
Abstract: The main problem for externalism in epistemology is to avoid making knowledge the result of processes of which the subject herself is unaware. Sosa accommodates this demand in his theories, but some tensions remain. As we try to understand how we think about our own beliefs, we find mechanisms that are external to the subject and cannot be internalized. The externalization of knowledge has a very large scope. A person who accepts only what she can prove is someone who refuses a large body of human knowledge. For a layperson - that is, for everyone, in some domain or other -, to assume what is the product of culture is to accept contents that remain opaque. The externalization of knowledge is a deep feature of human culture. It is maybe less usual to connect the evolution of culture with traditional concerns in epistemology.