Resumo Este artigo aborda os danos ao rosto feminino provocados por parceiro íntimo à luz do pressuposto cultural da face como locus corporal privilegiado e de alto valor simbólico. Com aporte quanti-qualitativo, o estudo objetivou: estimar a prevalência de lesões na face, cabeça e pescoço de mulheres agredidas pelo parceiro; apreender os significados, na visão das vítimas, das marcas originárias da violência; e investigar questões acerca do cuidado em saúde no tratamento dos agravos. Os dados estatísticos foram obtidos em boletins de ocorrência da Delegacia Especial de Atendimento à Mulher de Salvador, Bahia, e a fase qualitativa da pesquisa constou de entrevistas com mulheres que recorreram à delegacia para denunciar o agressor. Estimou-se que, em 63,2% dos casos estudados, houve trauma na face e/ou cabeça e/ou pescoço da mulher agredida. A análise das falas revelou que os danos faciais, sobretudo os permanentes, tendem a produzir sentimentos de autodepreciação, humilhação e vergonha na vítima, gerando acentuado sofrimento psíquico. Ficou evidenciado que a atenção em saúde limitou-se aos aspectos físicos da vitimização, sem a percepção da violência conjugal como problema de saúde e consequente ausência de referenciamento das usuárias à rede de assistência à mulher em situação de violência.
Abstract This article focuses on female facial injuries caused by domestic partners in the light of the cultural assumption that the face is the most valued area of the human body. Through a quantitative/qualitative approach, the study aimed to estimate the prevalence of lesions on the face, head and neck of women abused by their partners. The intention is to comprehend the significance, from the victim's standpoint, of the marks originated in the violent episode and investigate issues concerning healthcare in the treatment of injuries. Statistical data were obtained from reports of the Special Police Department for Women in Salvador, Bahia, and the qualitative phase of research consisted of interviews with women who filed such reports. The results showed that, in 63.2% of studied cases, there were injuries to the face and/or head and/or neck of battered women. Speech analysis revealed that facial injuries, especially permanent ones, tend to result in feelings of low self-esteem, shame and humiliation in the victim, causing severe psychological distress. It was revealed that healthcare was limited to the physical aspects of victimization, without the perception of domestic violence as a health problem and the consequent lack of referral of patients to the centers for women in situations of violence.