O paciente fôra apresentado duas vêzes em reuniões clínicas, para diagnóstico diferencial entre alterações neuropsíquicas orgânicas e pitiatismo. Da primeira, aos 2 meses de internação, releva notar os seguintes dados: trabalho mental lento, porém sem distúrbios intelectuais intrínsecos; atenção pouco fixável; expressão verbal sem transtornos intrínsecos, mas escassa; carência global de iniciativa; indiferença para com a própria situação; atitudes por vezes teatrais, em aparência pitiáticas; hipertonia muscular variável, aparentemente despertada pelo exame; marcha em pequenos passos, com incerteza variável; queda lenta, em direção inconstante; camptocormia, que se exagera quando desamparado; crises tônicas, de tipo da descerebração; condições somáticas precárias; exame neuro-oftalmológico só possível quanto a fundos oculares, sem anormalidade; exames de líquor incompletos, com alterações discretas; reações negativas para sífilis no líquor e no sangue. Diagnóstico provisório: Psicose por lesão cerebral, com provável comprometimento orgânico da região frontal orbitaria ou da via fronto-ponto-cerebelar. Ao ser apresentado da segunda vez, decorridos três meses, estavam mais acentuados o desligamento para com o ambiente, a carência de iniciativa, a total incapacidade para cuidar de si, com espurcícia; agravou-se a perturbação da marcha com completa astasia-abasia e com ataxia do tronco; tornaram-se mais freqüentes as crises tônicas de tipo cerebelar; repetidos os exames de líquor, ainda incompletos, denotaram alterações do mesmo tipo anterior; o exame de fundos oculares foi novamente negativo; não fôra ainda possível a pneumencefalografia. A evolução dos distúrbios, com alterações de origem orgânica evidente e com outras aparentemente pitiáticas, permitiu precisar o aspecto localizatório: Síndrome frontal orbitaria por alterações cerebelares prováveis. Sòmente cinco meses após a primeira discussão clínica do quadro, quando obtido o exame completo do líquor, o diagnóstico etiológico pôde ser aventado. O exame neuro-oftalmológico foi ainda negativo. A evolução dos sintomas levou o doente à obnubilação e ao embotamento intelectuais, à espurcícia; e, pelo lado neurológico, à impossibilidade de locomoção, à ataxia do tronco, ao relaxamento dos esfincteres. Diagnóstico: quadro neuropsiquiátrico orbitario, como repercussão de alterações ponto-cerebelares; cisticercose provável. O paciente faleceu 11 meses após a internação. A necropsia revelou, quanto ao sistema nervoso central, um cacho de vesículas de cisticerco racemoso ao nível do ângulo ponto-cerebelar direito (fig. 1) e espessamento das leptomeninges na base do encéfalo até a dos lobos temporais. Nenhuma alteração histológica do córtex cerebral ou das vias intra-hemisféricas (Nissl e Weil). Quanto ao aspecto patogênico, o quadro orbitario descrito por Kleist era representado pela falência na manutenção do esfôrço e da atividade em geral (Ausdauer), na regência instintiva dos atos (gesinnungsmässige Handlungen), bem como pelo distúrbio teatral, tipo pitiático, do caráter (Gesin-nung). Os transtornos neurológicos e mesmo neurovegetativos correspondiam, na opinião dos autores, à falência paleocerebelar.
The patient had been shown twice in seminar for discussion of differentia] diagnosis between pithiatism and organic brain lesions. At first, two months after admission, the pattern was as follows: no peculiar troubles in thinking; impaired attention; poor spontaneous speech; general lack of initiative; no care for the self; behavior sometimes theatrical, apparently pithiatic; muscular hypertonia, aroused by the examination; gait uneaven, by short steps, subject falling often, in no predictable direction; tonic spells, decerebrate in type; poor bodily status. No neurophthalmic disorders (only the fundi examination was feasible, for lack in cooperation); mild alterations at the spinal fluid tests; tests for syphilis negative in the serum and in the spinal fluid. Provisional diagnosis: psychosis with brain lesions, probably in the orbital region or along fronto-ponto-cerebellar pathways. At the second time, three months later, seclusion was growing worse, lack of undertaking was most marked, the patient was completely unable to care for himself and remained conspurcated; gait troubles were accrued with astasia-abasia and trunk ataxia; cerebellar fits were more frequent; fluid examinations, still incomplete, and neurophthalmic data gave no new results; pneumoencephalography was not yet available. The pattern of intermixed organic troubles and pithiatic behavior led to a closer pathogenetic diagnosis: orbital syndrome due to cerebellar lesions probably. It was only five months after admission that proper fluid examination was available, and then rendered an etiologic diagnosis possible. The patient was then unable to walk and to take care of himself, and remained unalert. Diagnosis: neuropsychiatry orbital syndrome evoked by cerebellopontine disturbances; cysticercosis probably. Exitus eleven months after admission. Necropsy disclosed, as for the c.n.s., a bunch of cysticercus racemosus at the cerebello-pontine region, at right (fig. 1); leptomeninges were somewhat thick at the basis until the temporal lobes. No alteration of the frontal lobes or elsewhere, macro-scopically and histologically as well (at Nissl and Weil stains). As for the pathogenesis, the orbital patterns, in sensu Kleist's, consisted of lack in maintaining mental alertness and the initiative (Ausdauer), in the instinctual drives (gesinnungsmassige Handlungen), as well as of the theatrical troubles of character (Gesinnung). Neurological and neuro-vegetative troubles were to be ascribed to paleo-cerebellar regulations, in the authors' mind.