RESUMO Este artigo demonstra que há uma crise histórica dos sujeitos políticos que organizaram a dinâmica de fundação e construção dos Estados do Bem-Estar Social no pós-guerra, e que esta se manifesta na temporalidade própria e tardia da construção do Sistema Único de Saúde (SUS). O centro dessa crise estaria no processo de mudança epocal da tradição liberal, que passou a ter o paradigma neoliberal como dominante. A primeira parte do artigo apresenta os fundamentos políticos, a gênese e o desenvolvimento do pensamento neoliberal, localizando o seu ataque frontal às culturas da solidariedade, da fraternidade, do universalismo. O segundo momento do artigo demonstra como essa crise internacional afetou os sujeitos políticos fundadores do SUS, formando um contexto que, se não foi capaz de desconstitucionalizá-lo, minava suas bases financeiras e de legitimação pública. A terceira parte aponta que a repactuação histórica em torno do SUS passaria por uma (re)construção de seus sujeitos políticos em uma nova coalizão por meio do reencontro das culturas do republicanismo e do socialismo democráticos. Repondo a consciência sanitária neste novo horizonte civilizatório, renovando sua linguagem pública e sua capacidade de fazer convergir os novos movimentos sociais, o projeto SUS reataria o seu destino ao processo de refundação da democracia brasileira em crise.
ABSTRACT This paper shows that there is a historical crisis of the political subjects that organized the foundation and construction dynamics of the Welfare States in the postwar period and that manifests itself in the late temporality of the construction of the SUS (Unified Health System). The crisis can be located in the change process of the liberal tradition, which came to have the neoliberal paradigm as dominant. The first part of the paper presents the political foundations, genesis, and development of the neoliberal thought, locating its frontal attack on the cultures of solidarity, fraternity, of universalism. Then, it shows how this international crisis affected the political subjects of the SUS, forming a context that, if not able to deconstitutionalize it, undermined its financial bases and its public legitimization. The third part points out that the historical renegotiation around the SUS would go through a (re)construction of its political subjects in a new coalition, through the reencounter of the cultures of democratic republicanism and socialism. Restoring sanitary awareness in this new civilizing horizon, renewing its public language and its ability to bring the new social movements together, the SUS project would reunite its destiny to the process of refounding the Brazilian democracy which is now in crisis.