RESUMO Sob a perspectiva da Reforma Psiquiátrica, a presente pesquisa objetivou apresentar relatos de violência institucional em internações de longa duração em um manicômio a partir de itinerários de vida de pessoas em processo de desinstitucionalização. Foi realizada observação participante de nove beneficiários do Programa De Volta para Casa desospitalizados há 13 anos em município de grande porte da Bahia. Os diários de campo, assim como transcrições de entrevistas semiestruturadas com três profissionais de saúde, foram transformados em nove narrativas, que, analisadas qualitativamente, permitiram identificar violências sofridas no período anterior à admissão no hospital e da internação. As razões de internação diferiram por gênero: homens foram internados por crimes contra a pessoa; mulheres, por ‘quebra de resguardo’, frustrações amorosas e violência física e sexual. Durante a internação, emergiram o cotidiano administrado e a exposição à violência institucional (ausência de atividades socioterapêuticas, medicação em doses punitivas com efeito sedativo, negligência à saúde física, agressão física, confinamento, ‘injeção’ e ‘choque elétrico’, preconceito, estigma), em que os sujeitos tiveram neutralizadas suas possibilidades de reação à dominação. Os resultados proporcionaram reflexão sobre a violência do Estado, crucial no atual contexto de desconstrução da Política Nacional de Saúde Mental.
ABSTRACT Under the perspective of the Psychiatric Reform, the aim of this article is .to present reports of institutional violence in long-term psychiatric hospitalizations, based on the life itineraries of people in the process of deinstitutionalization in a large municipality in the state of Bahia, Brazil. We carried out participating observation including nine beneficiaries of the ‘De Volta para Casa’ (‘Back Home’) Program, who left the hospital thirteen years ago; and three semi-structured interviews with workers who assisted them. The researchers’ field diaries and the interviews transcripts were transformed into narratives, which were analyzed qualitatively, in order to identify violence suffered before admission or during hospitalization. Reasons for hospitalization differed by gender: men were hospitalized for crimes against people; women, for ‘breaking seclusion’, love frustrations, physical and sexual violence. Contents about the administered daily life, and exposure to institutional violence (absence of socio-therapeutic activities, medication in punitive doses with sedative effect, neglect concerning physical health, physical aggression, confinement, ‘injection’, ‘electric shock’, prejudice, stigma), emerged from the reports about the hospitalization period, showing that the subjects had their possibilities of reacting against domination neutralized. The results provided reflection on State violence, crucial in the current context of deconstruction of the Brazilian Mental Health Policy.