Organismos exclusivamente subterrâneos (troglóbios) usualmente exibem, entre as apomorfias relacionadas à evolução em isolamento nesse ambiente (troglomorfismos), a redução, até perda total, das estruturas visuais e da pigmentação melânica. Os mecanismos de regressão ocular em troglóbios têm sido intensivamente estudados, sobretudo em peixes como os lambaris cegos mexicanos do gênero Astyanax, e salamandras como Proteus anguinus. Por outro lado, poucos são os trabalhos abordando a perda da pigmentação nesses organismos. A ictiofauna subterrânea brasileira destaca-se não só pela riqueza de espécies (23 conhecidas até o momento) como também pelas diferenças no seu grau de troglomorfismo, sem uma correlação taxonômica. O presente estudo abordou as espécies brasileiras totalmente desprovidas de qualquer traço de pigmentação melânica: o caraciforme Stygichthys typhlops (Characidae) e os siluriformes Ancistrus formoso (Loricariidae), Rhamdiopsis sp.1 (Heptapteridae; cavernas da Chapada Diamantina, Bahia) e Rhamdiopsis sp. 2 (caverna de Campo Formoso, Bahia). Com a finalidade de investigar se essa despigmentação é resultado de bloqueio em algum passo da cadeia de síntese de melanina, foram feitos testes in vitro, utilizando-se fragmentos da nadadeira caudal extraídos de exemplares mantidos vivos, de reação à administração de L-DOPA. Com exceção dos de Rhamdiopsis sp. 2, os exemplares estudados revelaram-se DOPA(+), i.e., houve produção de melanina após a administração de L-DOPA, o que indica que sua despigmentação é devida a uma disfunção da tirosinase, enzima responsável pela transformação de tirosina em L-DOPA nos melanóforos, os quais, portanto, ainda existem nesses peixes. Já os exemplares Rhamdiopsis sp. 2, assim como o terço conspicuamente despigmentado da população de Trichomycterus itacarambiensis, espécie estudada anteriormente sob esse aspecto, são DOPA(-), seja porque o bloqueio na síntese de melanina ocorre em um passo a jusante da produção de L-DOPA, aparentemente o caso de T. itacarambiensis (herança monogênica em vista da descontinuidade fenotípica), ou porque houve perda total dos melanóforos. A perda fisiológica da capacidade de sintetizar melanina, aparentemente causada por diferentes mecanismos nas populações DOPA(+) e naquelas DOPA(-), pode co-existir com a redução no número e tamanho dos melanóforos, como observado nos dois terços pigmentados de T. itacarambiensis, provavelmente determinada por herança poligênica, que produz uma distribuição contínua de fenótipos.
Troglobitic (exclusively subterranean) organisms usually present, among their apomorphies related to the subterranean life (troglomorphisms), the regression of eyes and melanic pigmentation. The degree of regression varies among species, from a slight reduction to the complete loss of eyes and dark pigmentation, without a taxonomic correlation. While mechanisms of eye reduction have been intensively investigated in some troglobites such as the Mexican blind tetra characins, genus Astyanax, and the European salamander, Proteus anguinus, few studies have focused on pigmentation. The Brazilian subterranean ichthyofauna distinguishes not only by the species richness (23 troglobitic fishes so far known) but also by the variation in the degree of reduction of eyes and pigmentation. This study focused on Brazilian fishes completely devoid of melanic pigmentation: the characiform Stygichthys typhlops (Characidae) and the siluriforms Ancistrus formoso (Loricariidae), Rhamdiopsis sp.1 (Heptapteridae; from caves in the Chapada Diamantina, Bahia) and Rhamdiopsis sp. 2 (cave in Campo Formoso, Bahia). In order to investigate if such depigmentation is the result of blockage in some step in the melanogenesis, in vitro tests of administration of L-DOPA were done, using caudal-fin fragments extracted from living fish. Except for Rhamdiopsis sp. 2, all the studied species were DOPA(+), i.e., melanin was synthesized after L-DOPA administration. This indicates these fish do have melanophores but they are unable to convert L-tyrosine to L-DOPA. On the other hand, Rhamdiopsis sp. 2, like the albino specimens of Trichomycterus itacarambiensis previously studied (which correspond to one third of the population), are DOPA(-), either because the block of melanin synthesis occurs downstream in melanogenesis, which is probably the case with T. itacarambiensis (monogenic system in view of the phenotypic discontinuity), or because the so-called albinos do no possess melanophores. The physiological loss in the ability to synthesize melanin, apparently caused by different genetic processes in DOPA(+) and in DOPA(-) fishes, may co-exist in subterranean populations with a decrease in the density of melanophores, as observed in the pigmented two thirds of T. itacarambiensis population, a morphological reduction apparently controlled by polygenic systems producing a continuous phenotypic variation.