Trajetórias educacionais longevas de pessoas oriundas das camadas populares são objetos frequentes de reflexão sociológica. Pesquisas relevantes permitiram o avanço do conhecimento quanto às práticas que favorecem a emergência de alguns desses casos improváveis. O presente artigo aborda esta temática a partir de dados obtidos através de entrevistas em profundidade realizadas com 25 pessoas de origem popular, que representam a primeira geração de suas famílias a cursar o ensino superior. O objetivo é problematizar a imagem comumente atribuída a estas trajetórias, a qual usualmente ressalta o sofrimento, o sentimento de não pertencimento e a ruptura cultural com o meio de origem. Argumenta-se, aqui, que a construção de tal imagem é influenciada pela mobilização do conceito de trânsfuga de classe. Por meio da análise empírica, questiona-se a aplicação de tal conceito em favor de interpretações que considerem não apenas as diversas referências culturais a que estes indivíduos estão potencialmente sujeitos, mas também aquelas que os considerem atores sociais competentes para a leitura de diferentes contextos sociais.
Long-lived educational trajectories of people from lower classes are frequent objects of sociological reflection. Relevant research has allowed for knowledge advances concerning practices that favor the emergence of some of these unlikely cases. This article addresses this theme based on data obtained through in-depth interviews with 25 people presenting popular origins, who represent the first generation of their families to attend higher education. The aim is to problematize the image commonly attributed to these trajectories, which usually focuses on the suffering, the feeling of not belonging and the cultural rupture with the original working class environment. It is argued herein that the concept of such an image is influenced by the mobilization of the concept of class defector. Through an empirical analysis, this article criticizes the application of such a concept in favor of interpretations that consider not only the diverse cultural references to which these individuals are potentially subject to, but also those that consider them competent social actors for the reading of different social contexts.
La réussite scolaire de personnes de la classe ouvrière est un sujet de réflexion fréquent en sociologie. Et des recherches importantes ont permis de mieux connaître les pratiques favorisant l’ascension de certains de ces cas inattendus. Cet article analyse les données de 25 récits de personnes de la classe ouvrière brésilienne, les premiers de leur famille à avoir fréquenté un établissement d’enseignement supérieur. L’objectif est de remettre en question l’image habituellement associée à ces trajectoires: la plupart des études privilégie en effet la souffrance, le sentiment de non-appartenance et la rupture culturelle avec le milieu d’origine. Nous pensons que la construction d’une telle image est influencée par le concept de transfuge de classe. Sur la base de l’analyse empirique, le présent travail critique l’application de ce concept au détriment d’interprétations qui considèrent à la fois les différentes références culturelles susceptibles de concerner ces sujets, ainsi que celles qui les voient comme des acteurs sociaux capables de faire face à divers contextes sociaux.