O artigo apresenta uma análise dos efeitos da nova lei de drogas sobre a repressão legal ao consumo de substâncias ilícitas e o processamento formal dos casos encaminhados ao sistema de justiça criminal. Buscou-se compreender as práticas dos atores envolvidos com o controle social ou legal do uso de drogas e elucidar as dinâmicas das negociações envolvidas no processo de incriminação dos usuários, à luz do debate em torno das mudanças trazidas pelo novo diploma legal. Observou-se uma redução dos números de casos que entram no sistema como uso de drogas, o que não se explicaria somente pela mudança na lei, mas pela interpretação de que esse crime teria se descaracterizado. Argumentamos que o descaso com o processamento legal desse tipo de crime teria deixado sua administração a cargo dos policiais militares que fazem o policiamento ostensivo nas ruas, que ganharam um aval implícito para negociar o encaminhamento ou não do usuário para a delegacia e até mesmo influenciar o tipo penal em que ele será classificado. A imprecisão dos critérios legais para distinguir entre usuários e traficantes, somada à imensa disparidade entre as penas previstas para esses crimes - acentuada pela nova lei -, contribuiria para a negociação informal da maior ou menor punição dos indivíduos e reificaria os estereótipos policiais, favorecendo a arbitrariedade. Tal indefinição não resultaria de uma imprecisão da lei, mas da impossibilidade empírica de realizar-se um recorte preciso entre essas classificações.
This article analyzes the effects of the new drug law on legal repression of drug use and formal trial of cases that appear before the criminal justice system. We seek to understand the practice of the actors involved in social and legal control of drug use and to elucidate the dynamics of negotiations of criminal charges against users, in light of the debate on the changes brought about by new legislation. There has been a reduction in the number of criminal charges related to drug use, something which cannot explained by legal changes alone by the notion that this crime has gained new interpretation. We argue here that the lack of interest in criminal charges for drug use has left it in the hands of the military police who ostentively patrol city streets. They have gained an implicit mandate to negotiate whether users are arrested or not, and even acquire influence over what type of penal classification is imputed. The imprecise nature of the legal criteria employed to distinguish users and dealers, together with the immense disparity in the sentences given for these crimes which the new law accentuates, contribute to informal negotiation of greater or lesser charges and reifies police stereoptypes, favoring arbitrariness. This indefinition is not a result of imprecise law, but of the empirical impossibility to draw a clear-cut line between types of classifications
L'article présente une analyse des effets de la nouvelle loi sur les drogues, sur la répression légale à la consommation de substances illicites, et la procédure formelle des cas envoyés au systéme de justice criminelle. On a cherché à comprendre les pratiques des acteurs intervenants dans le contrôle social ou légal de l'usage de drogues et élucider les dynamiques des négotiations dans le processus d'incrimination des utilisateurs, à la lumière du débat autour des changements apportés par le nouveau diplôme légal. On a observé une réduction du nombre de cas qui sont envoyés au système comme étant de l'utilisation de drogues, ce qui ne serait pas expliqué seulement par le changement de la loi, mais par l'interprétation selon laquelle ce crime aurait été altéré. Nous argumentons que l'indifférence avec le processus légal de ce type de crime aurait laissé son administration comme tâche à être accomplie par les policiers militaires qui font la surveillance ostensible dans les rues, qui ont gagné une autorisation implicite pour négotier l'orientation ou non de l'utilisateur jusqu'au comissariat et même influencer le type pénal où il sera classé. Le manque de précision des critères légaux pour distinguer les utilisateurs des narco-trafiquants, ajoutée à l'immense disparité entre les punitions prévues pour ces crimes là - soulignée à cause de la nouvelle loi - , contribuerait pour la négotiation informelle de la plus sévère ou moins sévère punition des individus et traite les stéréotypes policiers, favorisant ainsi l'arbitrarité. Cet indéfinition ne serait pas le résultat d'un manque de précision de la loi, mais plutôt de l'impossibilité empirique de la réalisation d'une sélection précise entre ces classements.