Resumo A infância e a juventude têm sido pensadas e vividas sob o signo da menoridade. Quando fogem ao controle social são inclusive pensadas como uma doença que precisa ser curada. Este artigo traça uma breve genealogia do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), colocando em relevo os avanços que ele promoveu em relação às anteriores legislações acerca da infância no Brasil, os Códigos de Menores. Analisa a emergência do ECA no contexto da Nova República e do processo de redemocratização do país por meio do operador conceitual governamentalidade democrática, mostrando que se tratava de subjetivar crianças e jovens como cidadãos de direitos, sob uma lógica de proteção integral. Tratava-se de uma forma democrática de governo, mas ainda assim um governo da infância e da juventude, mantendo-as sob a tutela dos adultos. Apesar dos avanços, chama a atenção para os limites dessa legislação, visto que crianças e jovens continuam morrendo em massa ou sendo encarcerados, apesar da política de proteção integral. Ao questionar a respeito das possíveis linhas de fuga ao governo da infância, outro pensamento político que a tome fora da condição de menoridade, o texto explora a filosofia de Charles Fourier, que concebe uma relação completamente distinta entre crianças, jovens e adultos, sem qualquer tutela. Nas palavras de René Schérer, uma infância maior, emancipada, signo de uma grande saúde.
Abstract Childhood and youth have been addressed and lived out under the sign of minority. Outside social control, they are actually considered as a “disease” that must be cured. This article briefly outlines the genealogy of the Statute of the Child and Adolescent (ECA), highlighting its advances in relation to previous legislation on childhood in Brazil, the Code of Minors. It analyzes the emergence of ECA against the background of the New Republic and the redemocratization process in Brazil, through the conceptual operator of democratic governmentality, showing that it related to the subjectification of children and youth as citizens of rights, under a logic of comprehensive protection. A democratic form of government, yet a government of childhood and youth, nonetheless, keeping them under the guardianship of adults. It draws attention to the limitations of this legislation since, despite the advances and comprehensive protection policy, children and youth continue dying or being incarcerated on large scale. Considering possible escape routes from the government of childhood, a distinct political approach outside the condition of minority, the text explores the philosophy of Charles Fourier, who conceives a completely different relationship between children, youth and adults, refuting any kind of guardianship. In the words of René Schérer, a “majority childhood,” emancipated, a sign of great health.