RESUMO Abrigando um expressivo número de quilombos ao longo do século XVIII, a zona entre os rios Grande, São Francisco e Paranaíba era conhecida como sertão do Campo Grande, tendo em seu entorno importantes núcleos de exploração mineradora e agropecuária das capitanias de Goiás, Minas Gerais e São Paulo. Com o objetivo de dilatar seus domínios, o Estado português organizou campanhas militares para conquistar esse planalto fértil habitado por quilombolas e ameríndios inimigos. Neste artigo abordamos a expedição liderada por Ignacio Correya Pamplona em 1769, analisando as estratégias usadas por essa campanha para a expansão territorial luso-americana por meio do combate aos quilombolas e da apropriação de suas terras. Para isso, examinamos um conjunto de documentos produzidos pelos próprios expedicionários que conta com relatos escritos, desenhos do interior de quilombos e um mapa da região explorada. Na análise documental e na tradução do mapa sertanista para a cartografia recente, verificamos que os quilombos destruídos (que possuíam roças, pilões, manufaturas e diversificadas organizações sociopolíticas) foram usados como base para o estabelecimento da estrutura colonial luso-americana, por meio da instalação de estradas, ranchos para descanso e abastecimento de tropas, demarcação de fazendas e povoados destinados aos súditos da coroa Bragança. O estudo desse episódio da guerra entre quilombolas e luso-americanos revela que, involuntariamente, tais quilombos foram elementos pioneiros na formação da malha territorial nessa região que atualmente integra o Triângulo Mineiro.
ABSTRACT The area between Grande, São Francisco, and Paranaíba Rivers was known as Sertão of Campo Grande. It was home to a significant number of quilombos throughout the 18th century, and surrounded by important gold mining and farming centers of the captaincies of Goiás, Minas Gerais, and São Paulo. Aiming at expanding its domains, the Portuguese Crown organized military campaigns to conquer that fertile plateau inhabited by its enemies - quilombolas and Amerindians. In this paper, we will address these expeditions, namely the one led by Ignacio Correya Pamplona in 1769, analyzing the strategies used by the campaign aimed at the Luso-American territorial expansion through fighting the quilombolas and appropriating their lands. For such purpose, we examine a set of documents executed by the expedition members themselves, which include written reports, drawings depicting the inside of the quilombos, and a map of the region explored. After analyzing these documents and translating the colonial map into recent cartography, we verified that the quilombos destroyed (which had vegetable plots, pestles, manufacturing activities, diverse social-political organizations) were used as the basis to establish the Luso-American colonial structure by the construction of roads, ranches for troops to rest and find supply, demarcation of farms and villages for the subjects of the Bragança Crown. Studying this episode of the war between quilombolas and Luso-Americans shows that, involuntarily, the aforementioned quilombos were pioneer elements for the formation of the territorial network in the area that today is part of the Triângulo Mineiro.