A exposição deste artigo divide-se em duas partes bem distintas. Na primeira, após discussão das noções de cidadania e qualidade da democracia, são apresentados os resultados de um survey sobre o exercício da cidadania política em Portugal. Todas as medidas convencionais indicam um débil exercício dos direitos políticos pela população desse país. Os correlatos sociológicos do exercício da cidadania são relativamente previsíveis, confirmando a tendência para a concentração dos instrumentos da participação e da representação política pelas camadas com instrução e capital social mais elevados. Em contrapartida, o forte distanciamento sentido em relação ao poder político atravessa a população de forma indiferenciada. A segunda parte é uma pesquisa histórica de fatores que ajudam a explicar, a partir da constituição real da sociedade civil, a atual distância ao poder. No decurso da pesquisa, são discutidos vários autores que se detiveram sobre a questão da cidadania no Brasil. Dois elementos são identificados na cadeia de efeitos que gerou os déficits de cidadania atualmente verificados: a falta de instrução das massas e o despotismo administrativo do Estado. Como conclusão, a explicação da distância ao poder entra também em conta com estratégias populares, cuja negatividade à luz do conceito liberal de cidadania pode esconder dimensões positivas de resistência e adaptação, como sucede com configurações sociais como o chamado "familismo amoral".
The paper is divided in two clearly distinct parts. In the first one, after discussing the notions of citizenship and quality of democracy, the results of a survey showing a weak propensity of the Portuguese population to exercise its citizenship rights are presented. The sociological correlates are predictable and they tend to confirm the tendency of strata with more education and social capital to concentrate in their hands the instruments of political participation and representation. On the contrary, the distance felt by the majority of the population towards political power does not depend on its social properties. In the second part, the results of a historical research accounting for such 'power distance' from the standpoint of 'real civil societies' are presented. In the course of the presentation, the research will be expanded to Brazil with the help of several authors who have discussed the issue of citizenship there. Two main elements are identified in the chain of effects accounting for deficits in the exercise of rights: mass illiteracy and the 'administrative despotism' of the State. To conclude, popular strategies of resistance and adaptation to modernization, however negative in the light of the liberal notion of citizenship, such as the so-called 'amoral familism', are called upon in order to more fully account for the distance towards political power felt in Portugal and perhaps Brazil.
Cet article est divisé en deux parties distinctes. Dans une première partie, après la discussion de notions de citoyenneté et de qualité de la démocratie, nous présentons les résultats d'une enquête qui indique un exercice débile de la citoyenneté politique au Portugal. Les corrélats sociologiques de l'exercice de la citoyenneté sont prévisibles et confirment la tendance des couches sociales possédant une instruction et un capital social plus élevés pour la concentrer dans les mains des instruments de participation et de représentation politiques. En contrepartie, l'importante distance perçue par rapport au pouvoir politique traverse la population de forme indifférenciée. La seconde partie est une recherche historique de facteurs qui aident à expliquer, à partir de la constitution réelle de la société civile, celle de la «distance du pouvoir ". Tout au long de notre article, la recherche sera élargie au Brésil grâce à l'aide de plusieurs auteurs qui se sont penchés sur la question de la citoyenneté dans ce pays. Deux éléments sont identifiés dans la chaîne d'effets qui aura géré les déficits de citoyenneté que l'on vérifie actuellement: l'illettrisme des masses et le despotisme administratif de l'État. En conclusion, l'explication de la distance par rapport au pouvoir entre également en compte avec des stratégies populaires, dont la négation à la lumière du concept libéral de citoyenneté peut cacher des dimensions positives de résistance et d'adaptation, comme il se passe avec le "familisme amoral ".