O presente artigo visa compreender a influência da articulação de organizações públicas e privadas, por meio da mobilização de recursos e estratégias de framing, no processo de construção social da Lei Federal n. 9.454/97, que instituiu o Registro Único de Identificação Civil brasileiro (RIC) no período de 1997 a 2011. O trabalho se fundamenta na ideia de que textos legais são passíveis de interpretações acerca de sua aplicabilidade, alcance e validade no campo organizacional, o que implica admitir diferentes concepções de legalidade. Para tanto, considera organizações públicas e privadas como agentes engajados na política de produção e manutenção de significados legais. A coleta dos dados considerou fontes documentais, tratadas longitudinalmente, e entrevistas semiestruturadas, de natureza seccional retrospectiva. Utilizou-se análise qualitativa de conteúdo, de base temática, a partir de categorias predefinidas e emergentes. O período considerado vai de 1997 a 2011, marcado pela lacuna entre a vigência legal e a vigência social da Lei Federal n. 9.454/97. Apesar dos interesses distintos, resultados evidenciaram o engajamento de organizações públicas e privadas com o compartilhamento de uma interpretação acerca da legalidade. Também foram constatadas ações que conflitavam com parâmetros institucionalizados e que contrariavam leis existentes - as quais foram legitimadas em função de sua aderência à noção de legalidade socialmente compartilhada. Conclui-se que noções de legitimidade e legalidade estão articuladas por meio do significado dado às leis e compartilhado entre os pares no campo organizacional. Nesse sentido, o trabalho favorece a aproximação de aspectos do institucionalismo organizacional e da sociologia do direito no tratamento do ambiente legal, como parte do contexto institucional das organizações.
ABSTRACT The purpose of this paper is to analyze how much the articulation of both private and public organizations influenced, by means of mobilizing resources and framing strategies, the process of social construction of the Federal Act n. 9.454/1997, which established the Civil Identity Registry in Brazil (RIC), from 1997 to 2011. The present work is based on the assumption that legal texts are open to interpretations regarding their applicability, reach and validity in organizational fields, resulting in different conceptions of legality. As such, we consider public and private organizations as engaged agents in politics of production and maintenance of legal meanings. Our research covers the period from 1997 to 2011, which comprehends the gap between the legal validity and the social effec tiveness of the Federal Act n. 9.454/1997. We use longitudinal data based on documentary sources and sectional retrospective data based on semi-structured interviews. Thematic based qualitative content analysis was performed. We use a priori and emergent categories. The results show that both public and private organizations were engaged in the development of a shared interpretation of the law, although with different interests. Moreover, the findings revealed actions in conflict with institutionalized norms and contradictory to existent laws - but they were legitimized because of their adherence to a socially shared notion of legality. In conclusion, we argue that the notion of legitimacy and legality are intertwined through the shared meanings given to laws in an organizational field. As such, we contend the theoretical proximity between organizational institutionalism and sociology of law in order to consider the legal environment as partial content of the institutional context of organizations.
RESUMEN Este estudio tiene el objetivo de comprender la influencia de la articulación de organizaciones públicas y privadas, mediante la movilización de recursos y estrategias de framing, en el proceso de construcción social de la Ley Federal n. 9.454/ 1997, que estableció el Registro Único de Identificación Civil (RIC) en el periodo 1997-2011. La fundamentación del trabajo ocurre en la idea de que los textos legales están sujetos a interpretaciones sobre su aplicabilidad, el alcance y la validez en el campo organizacional, lo que implica aceptar diferentes concepciones de la legalidad. Con este fin, considera organizaciones públicas y privadas como agentes capaces de participar activamente en la política de producción y mantenimiento de significados legales. La recolección de los datos consideró fuentes documentales, tratadas longitudinalmente, y entrevistas semi-estructuradas de naturaleza seccional retrospectiva. Se realizó un análisis cualitativo de contenido, de base temática, a partir de categorías a priori y emergentes. El período considerado va de 1997 a 2011, marcado por la laguna entre la vigencia legal y la vigencia social de la ley Federal n. 9.454/1997. A pesar de intereses distintos los resultados mostraron que la participación de las organizaciones públicas y privadas con intereses diferentes, ocurrió por medio de actividades guiadas por esfuerzo de la interpretación compartida acerca de la legalidad. Se observó también acciones que entraban en conflicto con los parámetros institucionalizados y que contrariaban leyes existentes - y que así mismo fueron legitimados por su adhesión a la noción socialmente compartida de legalidad. La conclusión es que la noción acerca de la legitimidad y de la legalidad se articula a través de significados dados a las leyes y compartido entre los actores en el campo organizacional. Como tal, sostenemos la proximidad teórica entre institucionalismo organizacional y la sociología del derecho en el tratamiento del ambiente legal como parte del contexto institucional de las organizaciones.