Resumo Fundamento: A amiloidose por transtirretina (ATTR) é uma doença infiltrativa causada pela deposição anormal de proteína principalmente no coração e no sistema nervoso periférico. Quando acomete o coração, a doença manifesta-se como uma cardiomiopatia restritiva e, quando afeta o sistema nervoso periférico e autônomo, apresenta-se como uma polineuropatia, podendo ser chamada de Polineuropatia Amiloidótica Familiar (PAF). Existem dois subtipos de ATTR, a ATTR selvagem, em que não há variantes genéticas, e a ATTR hereditária, caracterizada por uma variante no gene que codifica a proteína transtirretina (T\TR). Em ambos os subtipos, o envolvimento cardíaco é o principal marcador prognóstico. Objetivos: Avaliar a prevalência do envolvimento cardíaco subclínico em uma amostra de pacientes com variantes genéticas no gene TTR usando a cintilografia com pirofosfato e o ecocardiograma com strain; comparar os achados cintilográficos e as medidas de strain; avaliar a associação entre PAF e o envolvimento subclínico; e analisar se existe uma associação entre uma variante genética específica e o envolvimento cardíaco. Métodos: Estudo transversal com carreadores de variantes no gene TTR sem sintomas cardiovasculares e sem alterações nos parâmetros da eletrocardiografia ou do ecocardiograma convencional. Todos os pacientes foram submetidos à cintilografia com pirofosfato e à ecocardiografia com análise de strain. O envolvimento cardíaco subclínico, definido como um escore de Perugini ≥ 2, razão Coração (C)/ Hemitórax Contralateral (CL) ≥ 1,5 em uma hora, C/CL ≥ 1,3 na terceira hora, ou um strain longitudinal global (SGL) ≤ −17%. Realizadas análises descritiva e analítica, e aplicados o teste exato de Fisher e o teste de Mann-Whitney. Um valor de p<0,05 foi considerado significativo. Resultados: Os 23 pacientes avaliados apresentavam uma idade mediana de 51 (37-57) anos, 15 (65,2%) eram do sexo feminino, 12 (52,2%) eram pardos, nove (39,1%) apresentavam hipertensão arterial sistêmica, e nove (39,1%) tinham um diagnóstico prévio de PAF. Dos nove pacientes com PAF, oito (34,8%) usavam tafamidis. As variantes genéticas identificadas foram Val142IIe, Val50Met e IIe127Val. O valor mediano do SGL foi −19% (-16% – −20%). Dos 23 pacientes, nove (39,1%; 95% CI = 29–49%) preencheram os critérios de envolvimento cardíaco, seis (26%) somente pelo critério do SGL. Não houve associação entre PAF e um carreador assintomático avaliado por ecocardiograma com análise de strain e pela cintilografia com pirofostato (p=0,19). A prevalência de hipertensão arterial sistêmica, diabetes mellitus, dislipidemia, tabagismo e SGL reduzido não foi diferente entre os grupos. A velocidade da onda e’ septal foi a única variável que apresentou diferença significativa entre os indivíduos com e sem SGL reduzido, com uma área sob a curva ROC de 0,80 (IC95% = 0,61–0,98, p = 0,027). A melhor acurácia diagnóstica foi alcançada com uma velocidade e’ septal ≤ 8,5 cm/s. Não houve associação entre o tipo de variante genética e o envolvimento cardíaco pré-clínico, nem entre o uso de tafamidis e este mesmo envolvimento (37,5% versus 40,0%, p = 0,90). Conclusão: O envolvimento cardíaco subclínico foi frequente em uma amostra de carreadores da variante genética do gene TTR. Um valor do SGL reduzido foi o achado mais comum. Não houve associação entre a presença de polineuropatia amiloidótica e o envolvimento subclínico. O tipo de variante genética não foi associado com envolvimento cardíaco precoce. Nesta amostra, o uso de tafamidis (20mg/dia) não foi associado com uma menor prevalência de envolvimento cardíaco subclínico.
Abstract Background: Transthyretin amyloidosis (ATTR) is an infiltrative disease caused by abnormal protein deposition mainly in the heart and peripheral nervous system. When it affects the heart, the disease presents as restrictive cardiomyopathy; when it affects the peripheral and autonomic nervous system, it manifests as polyneuropathy, and is called familial amyloid polyneuropathy (FAP). There are two ATTR subtypes: wild-type ATTR, where there is no mutation, and mutant ATTR (ATTRm), which is characterized by a mutation in the gene encoding the transthyretin protein (TTR). In both subtypes, cardiac involvement is the major marker of poor prognosis. Objectives: To assess the prevalence of subclinical cardiac involvement in a sample of patients with TTR gene mutation by using pyrophosphate scintigraphy and strain echocardiography; to compare scintigraphy and strain findings; to evaluate the association between neurological manifestations (FAP) and subclinical cardiac involvement; and to analyze whether there is an association between any specific mutation and cardiac involvement. Methods: This is a cross-sectional study with carriers of the TTR gene mutation, without cardiovascular symptoms or changes in electrocardiographic or conventional echocardiographic parameters. All patients underwent pyrophosphate scintigraphy and strain echocardiography. Subclinical cardiac involvement was defined as a Perugini score ≥ 2, heart-to-contralateral lung (H/CL) ratio ≥ 1.5 at 1 h, H/CL ≥1.3 at 3 h, or global longitudinal strain (GLS) ≤ −17%. Descriptive and analytical analyses were performed and Fisher's exact test and Mann–Whitney test were applied. A value of p < 0.05 was considered significant. Results: The 23 patients evaluated had a median age of 51 years (IQR 37–57 years), 15 (65.2%) were female, 12 (52.2%) were Pardo, nine (39.1%) had systemic arterial hypertension, and nine (39.1%) had a previous diagnosis of FAP. Of the nine patients with FAP, 8 (34.8%) were on tafamidis. The associated mutations were Val142IIe, Val50Met, and IIe127Val. The median GLS in the sample was −19% (−16% to −20%). Of the 23 patients, nine (39.1%; 95% CI = 29–49%) met criteria for cardiac involvement, six (26%) by the GLS-based criteria only. There was no association between having FAP and being an asymptomatic carrier, as assessed by strain echocardiography and pyrophosphate scintigraphy (p = 0.19). The prevalence of systemic arterial hypertension, diabetes mellitus, dyslipidemia, smoking, and reduced GLS did not differ between groups. Septal e’ wave velocity was the only variable that significantly differed between individuals with and without reduced GLS, with an area under the ROC curve of 0.80 (95% CI = 0.61–0.98, p = 0.027). The best diagnostic accuracy was achieved with a septal e’ velocity ≤ 8.5 cm/s. There was no association between mutation type and preclinical cardiac involvement, nor between tafamidis use and lower degree of cardiac involvement (37.5% versus 40.0%, p = 0.90). Conclusion: Subclinical cardiac involvement was common in a sample of TTR mutation carriers without cardiac involvement. Reduced left ventricular GLS was the most frequent finding. There was no association between the presence of amyloid polyneuropathy and subclinical cardiac involvement. Type of mutation was not associated with early cardiac involvement. In this sample, the use of tafamidis 20 mg/day was not associated with a lower prevalence of subclinical cardiac involvement.