Neste artigo, propomos uma reflexão acerca da etnografia, tendo como foco a aprendizagem e o engajamento do pesquisador nas práticas que pesquisa. Partindo das discussões sobre este tema na etnomusicologia e na antropologia da técnica, traçamos um diálogo entre as pesquisas de campo dos autores sobre repentistas na região Nordeste e pescadores na Amazônia. A partir de então são pensadas as implicações da inserção do antropólogo na atividade etnografada, vista não como um fim em si mesmo, mas como estratégia privilegiada para acessar conhecimentos e valores tácitos e irrefletidos, perceber as hierarquias entre diversos tipos de relações envolvidas no desempenho de uma atividade e analisar suas formas peculiares de aprendizagem. A comparação entre as etnografias da cantoria e da pesca não é trazida aqui para defender o privilégio epistemológico generalizado da prática, do corpo ou da experiência, em detrimento das estruturas, do discurso ou do pensamento. A própria comparação entre os engajamentos numa atividade eminentemente verbal e noutras que envolvem sobretudo habilidades perceptivo-motoras já nos distancia deste recorte. O engajamento é tomado aqui não como afirmação de princípio, mas como uma postura etnográfica maleável, capaz de favorecer a adequação entre as questões antropológicas e os regimes de abordagem empírica em situações particulares.
This article proposes a reflection on "ethnography", focusing on the researcher's learning of and engagement with research practices. Starting from discussions of this theme in ethnomusicology and in the anthropology of techniques, we trace a dialogue across the research fields of the authors among repentistas in the Brazilian Northeast and fishermen in Amazonia. Through this dialogue, we reflect on the implications of the anthropologist's insertion in ethnographic activity, which is not seen to be an end in itself, but a privileged means for accessing knowledge and tacit values, perceiving hierarchies among the diverse types of relations involved in the execution of an activity and analyzing peculiar forms of learning. The comparison between ethnographies of singing and fishing is not intended to affirm the epistemological privilege of practice, the body or experience over structures, discourse or thought. The very nature of the comparison, rooted in the engagements of an activity that is eminently verbal and another that mostly involves perceptive and motor abilities, distances our aim from this approach. Engagement is here understood not as a general principle, but as a malleable ethnographic posture, capable of adequately favouring the accomodation of anthropological questions and empirical regimes in specific situations.