Resumo: A partir de uma abordagem interseccional construtivista e levando em consideração os agenciamentos e negociações possíveis dentro de relações violentas, a pesquisa visou a compreender como mulheres negras ressignificam a violência de gênero a partir de seus relacionamentos afetivo-sexuais. Utilizaram-se como procedimentos a observação participante em grupos de reflexão e entrevistas individuais junto a mulheres assistidas por um Centro Especializado de Atendimento à Mulher em Situação de Violência na Baixada Fluminense, Rio de Janeiro, Brasil. Os resultados apontam que a violência de gênero está presente ao longo da trajetória de vida das interlocutoras. Nas narrativas é perceptível um sentimento de solidão afetivo-sexual provocada pela preterição dos parceiros ou potenciais parceiros, bem como experiências racistas e sexistas engendradas nos próprios relacionamentos ou no âmbito escolar e de trabalho. A violência, aparentemente restrita à relação entre parceiros íntimos, se desdobrou para outras relações familiares. A compreensão da violência como “falta de respeito” produziu uma espécie de “central de vigilância” entre as mulheres, evidenciando a construção de uma rede de solidariedade. Ao narrarem suas trajetórias de vida, essas mulheres rememoram o passado, o presente e o futuro e também a expectativa de se reinventarem como mulheres, negras, pobres e trabalhadoras. É preciso um esforço conjunto e contínuo da sociedade civil, das instituições de ensino e da esfera política para desconstruir modelos culturalmente instituídos que persistem em colocar as mulheres negras no lugar de submissão, de inferioridade e de marginalização.
Abstract: Based on a constructivist inter-sector approach and considering the possible agency and negotiations within violent relationships, the study aimed to understand how black women redefined gender violence according to their affective-sexual relationships. The procedures included participant observation in discussion groups and individual interviews with women seen at a Specialized Center for Women’s Care in the Baixada Fluminense, Rio de Janeiro State, Brazil. According to the results, gender violence is present throughout the women’s lives. The narratives reveal a feeling of affective-sexual loneliness caused by neglect by their partners or potential partners, as well as experiences with racist and sexist treatment in their own relationships at school and work. Violence, apparently limited to intimate partner relations, spills over into other family relations. Understanding violence as “lack of respect” produced a kind of “collective surveillance” among the women, evidencing the building of a solidarity network. By retelling their life stories, these women remember the past, present, and future with expectations by poor black working women of reinventing themselves. A joint on-going effort is needed by civil society, teaching institutions, and the political sphere to deconstruct culturally instituted models that persistently keep black women in a place of submission, inferiority, and marginalization.
Resumen: A partir de un abordaje interseccional constructivista, y considerando las gestiones y negociaciones posibles en el seno de relaciones violentas, la investigación tuvo como objetivo comprender cómo las mujeres negras resignifican la violencia de género a partir de sus relaciones afectivo-sexuales. Se utilizaron como procedimientos la observación participante en grupos de reflexión y entrevistas individuales junto a mujeres asistidas por un Centro Especializado de Atención a la Mujer en la Baixada Fluminense, Río de Janeiro, Brasil. Los resultados apuntan que la violencia de género está presente a lo largo de la trayectoria de vida de las interlocutoras. En las narrativas es perceptible un sentimiento de soledad afectivo-sexual, provocada por el rechazo de las parejas o potenciales parejas, así como experiencias racistas y sexistas engendradas en las propias relaciones o en el ámbito escolar y de trabajo. La violencia, aparentemente restringida a la relación entre miembros de la pareja, se desdobló en otras relaciones familiares. La comprensión de la violencia como “falta de respeto” produjo una especie de “central de vigilancia” entre las mujeres, poniendo en evidencia la construcción de una red de solidaridad. Al narrar sus trayectorias de vida, esas mujeres rememoran el pasado, el presente y el futuro y la expectativa de que se reinventen como mujeres, negras, pobres y trabajadoras. Es necesario un esfuerzo conjunto y continuo de la sociedad civil, de las instituciones de enseñanza y de la esfera política para deconstruir modelos culturalmente instituidos que persisten en situar a las mujeres en un lugar de sumisión, inferioridad y marginalización.