RESUMO O texto analisa a relação entre história e ficção na obra do escritor uruguaio Juan Carlos Onetti (1909-1994) a partir de dois temas que são recorrentes em sua obra: o passado e o exílio. Para tanto, recorre a dois contos, distantes quase vinte anos um do outro: “La cara de la desgracia”, publicado originalmente em 1960, e “Presencia”, de 1978. Em “La cara de la desgracia”, as lembranças atormentam o narrador, que entrevê, num encontro casual com uma garota, a possibilidade de reconstruir a própria memória e libertar-se do peso e da possessão do passado. Em “Presencia”, conto de forte conotação política, escrito durante o exílio de Onetti, o protagonista, também exilado, reinventa a realidade, por meio de uma falsa investigação, para “compensar a perda desorientadora, criando um mundo novo para governar” (Edward Said). Nos dois casos, desponta a figura de um escritor “impertinente”, estranho à tradição do chamado boom literário latino-americano dos anos 1960 e capaz de problematizar as fronteiras entre história e ficção.
ABSTRACT The text analyses the relationship between history and fiction in the Uruguayan writer Juan Carlos Onetti’s (1909-1994) work through the representation of the past and the exile. To accomplish this, the text examines two tales, written almost twenty years apart: “La cara de la desgracia” (1960) and “Presencia” (1978). In “La cara de la desgracia”, memories disturb the narrator, who glimpses, in a casual meeting with a young girl, the possibility to rebuild his memory and to free himself from the possession of the past. In “Presencia”, a political tale written in Onetti’s exile in seventies, the protagonist — who is also an exile —recreates reality through a fake investigation, to “compensating for disorientating loss by creating a new world to rule” (Edward Said). In the two tales, Onetti emerges as an “impertinent writer”, foreign to the tradition of the Latin American boom and able to explore the boundaries of history and fiction.