RESUMO Diante do campo da autobiografia e de seu cruzamento com o cinema, no contexto da experiência legada pela ditadura civil-militar brasileira, este artigo pretende investigar certos modos políticos de enunciação e subjetivação, aqui postos em cena pelos documentários autobiográficos “Os dias com ele” (Brasil, 2012), de Maria Clara Escobar, e “Diário de uma busca”, de Flávia Castro (Brasil, 2011). Nessas obras, realizadas por filhas de exilados e presos políticos, estão em jogo duas formas distintas de posição feminina e de busca pela figura paterna, nas quais coexistem exílio, memória, testemunho e até mesmo a disputa pelo filme que está sendo feito. Face ao problema do lugar secundário das filhas diante das utopias políticas dos pais, no contexto da experiência do fracasso das esquerdas no Brasil, “Os dias com ele” e “Diário de uma busca” propõem uma passagem do privado ao político, do pai ao país, a partir de uma ética da precariedade.
ABSTRACT At the crossroad of the autobiographic genre and cinema in the context of the legacy of Brazilian civil-military dictatorship, this article aims to investigate singular modes of enunciation and subjectivation as staged by two autobiographical documentaries: “Os dias com ele” (Brazil, 2012), by Maria Clara Escobar, and “Diário de uma busca”, by Flávia Castro (Brazil, 2011). Filmed by daughters of political exiles and prisoners, these works produce two different types of positions of a female in search of a paternal figure, in which exile, memory, testimony and even argument about the movie in progress coexist. Confronted with the problem of the daughter’s secondary role in comparison to the father’s politicals utopias, faced with the experience of the failure of the left in Brazil, “Os dias com ele” and “Diário de uma busca” propose a journey from the private to the political and from the father to the country through an ethics of precariousness.
RÉSUMÉ Face au champ de l’autobiographie et à son croisement avec le cinéma, dans le contexte de l’expérience héritée de la dictature civile-militaire au Brésil, cet article vise à étudier certains modes politiques d’énonciation et de subjectivation mis en scène ici par les documentaires autobiographiques “Os dias com ele” (Brésil, 2012), de Maria Clara Escobar, et “Diário de uma busca”, de Flávia Castro (Brésil, 2011). Dans ces œuvres menées par des filles d’exilés et des prisonniers politiques, deux différentes formes de position féminine et de la quête de la figure paternelle sont en jeu où l’exil, la mémoire, le témoignage et même le conflit autour du film en cours coexistent. Confronté au problème du rôle secondaire des filles par rapport aux utopies des pères, face à l’expérience de l’échec de la gauche au Brésil, “Os dias com ele” et “Diário de uma busca” proposent un passage du privé au politique, du père au pays, à partir d’une éthique de la précarité.