O presente estudo é uma reflexão sobre o conceito de saúde. A tese central do ensaio é que a equivalência de saúde e doença como situações polares opostas de uma mesma natureza de fenômenos, identificados segundo uma mesma racionalidade, é tão limitante para a adequada compreensão dessas duas construções discursivas e das práticas a elas relacionadas, quanto negar as estreitas relações que guardam uma com a outra na vida cotidiana. Com base na Hermenêutica Filosófica, de Hans-Georg Gadamer, e na Teoria da Ação Comunicativa, de Jürgen Habermas, procuramos demonstrar que os conceitos de saúde e doença se referem a interesses práticos e instrumentais, respectivamente, na elaboração racional de experiências vividas de processos de saúde-doença-cuidado. Defende-se que o obscurecimento desses distintos interesses decorre da "colonização da nossa experiência vivida" pelas estruturas conceituais das ciências biomédicas. Aponta-se para a necessidade de contrapor, a essa tendência, a reconstrução chamada humanizadora das práticas de saúde, tornando-nos todos, profissionais, serviços, programas e políticas de saúde, mais sensíveis, críticos e responsivos aos sucessos práticos sempre visados por meio e para além de qualquer êxito técnico no cuidado em saúde.
This is a reflection on the concept of health. The central thesis of the essay is that the assumption of health and disease as opposite polar situations of a same nature of phenomenon, identified by means of a same rationality, is as limiting to an appropriate understanding of these two discursive constructions as it would be the ignorance of their close relationships in daily life. Based on Hans-Georg Gadamer's Philosophical Hermeneutics and Jürgen Habermas' Theory of Communicative Action, we seek to demonstrate that the concepts of health and disease are referred respectively to practical and instrumental interests in the rational elaboration of lived experiences of the processes of heath-disease-care. We sustain that the darkening of these distinctions is due to the "colonization of our lives experience" by the conceptual structures of the biomedical sciences. We stress the need to oppose to this trend a reconstructive movement, the so called humanization of health practices, by becoming all of us, professionals, services, programs and health policies, more sensitive, critical and responsive to the practical successes always aimed by means and beyond any technical efficacy in health care.