Este artigo analisa disputas e momentos de inflexão no processo de autonomização das ciências sociais e das estruturas de produção e circulação de mensagens escritas sobre o Brasil, a partir da análise da edição e recepção de Casa-grande & senzala, de Gilberto Freyre. Entre os sucessivos prefácios do livro, da 1ª à 14ª edições, e a consagração de autores como Florestan Fernandes, desenvolve-se uma prolongada e violenta batalha simbólica para universalizar as formas legítimas (estilos narrativos, projetos institucionais, fórmulas editoriais, invenção e representação de comunidades de leitores) para pensar o Brasil. Seguindo este percurso, o artigo mostra como as representações que pesam sobre Freyre e seu livro de estréia, como regionalista, derivam tanto das posições e concepções que Freyre foi assumindo em sua trajetória, quanto das posições que foram se impondo no campo intelectual a partir dos anos 40 em São Paulo, com o objetivo de consolidar a "Sociologia científica e nacional". Somando à interpretação dos discursos os princípios de sua dispersão, como a edição e a institucionalização dos saberes universitários, o artigo busca compreender como livro e autor chegaram a ser o que são hoje em dia à luz de mudanças nos mecanismos de seleção do panteão dos intérpretes do Brasil.
The article analyses intellectual struggles and changes in the independence process of Brazilian social sciences and of the production and circulation of written messages about Brazil, by focusing on the publishing and reception of The masters and the slaves by Gilberto Freyre. Between the first and the 14th edition of the book and the consecration of authors such as Florestan Fernandes, a symbolic battle took place to universalize the genuine forms (narrative styles, institutional projects, editorial formulas, invention and representation of readers' communities) to think about Brazil. The article shows how the judgement over Freyre and his first book to be regionalist, is originated in the positions and conceptions that Freyre himself adopted on his trajectory as well as in the dominant positions on the intellectual field during the forties in São Paulo, which aimed to consolidate the "national and scientific Sociology". Altogether with the speeches' interpretation, the principles of its dispersion, the edition and the establishment of academic knowledge, the article seeks the understanding of how the book, the work and the author have become what they are at the present moment, enlightened by the changes in the selection means of Brazilian interpreters' pantheon.
Centré en l'histoire de l'édition et la réception de Maîtres et esclaves de Gilberto Freyre, ce travail constitue une analyse des disputes et moments d'inflexion dans le processus d'autonomisation des sciences sociales et des structures de production et circulation de messages écrits sur le Brésil. Entre les préfaces qui se sont succédées de la 1ère à la 14ème éditions de ce livre et la consécration d'auteurs tels que Florestan Fernandes, se déroule une bataille symbolique violente qui vise l'universalisation des formes légitimes (style narratif, projets institutionnels, formules éditoriales, invention et représentation de communautés de lecteurs) de penser sur le Brésil. Par ce parcours l'article montre comment les jugements faits sur Freyre et sur son œuvre, dits alors "régionalistes", dérivent des positions et conceptions qu'il a acquises au long de sa trajectoire, aussi bien que des positions dominantes depuis les années 40, destinées à consolider la "Sociologie scientifique et nationale". L'article cherche à comprendre comment l'ouvrage et l'auteur sont parvenus à ce qu'ils sont aujourd'hui dans le scénario de la Sociologie, à la lumière des transformations soumises par les moyens de sélection du panthéon des interprètes du Brésil. Ceci est fait par l'interprétation des discours et par l'analyse des principes de leur dispersion, de l'édition et de l'institutionnalisation des savoirs universitaires.