O trabalho resulta de uma pesquisa de abordagem etnográfica realizada em uma creche da Rede Pública de Ensino de Florianópolis (SC). Os dados foram analisados considerando-se o "tempo didático" - recomendado pela legislação -, estruturado por uma rotina constituída por diferentes momentos: entrada, higiene, alimentação, sono, parque, atividade orientada, saída. Inspirado por tópicas da Teoria Crítica da Sociedade, o texto aborda os momentos de parque, declarados como "ocasiões privilegiadas de educação", tanto nos discursos das professoras, quanto nas ações que distinguem esses momentos dos demais, estabelecendo uma certa contraposição entre "tempo de trabalho" e "tempo livre". Nessa relação, além de configurarem-se como períodos de renovação das energias para as demais atividades, esses momentos acabam por escusar um acompanhamento mais atento por parte dos professores: o olhar adulto "precisará" apenas afastar as crianças de locais inconvenientes ou evitar feridas "expostas", conformando um conjunto de práticas sociossanitárias centradas nas necessidades vitais e que contribuem na eliminação de desvios e diferenças, na garantia de pseudogratificações. A ausência de uma aproximação mais atenta também colocará as crianças entregues a uma ambígua "espontaneidade", sujeitas à violência que acaba por produzir cicatrizes que se colocam, principalmente, sobre o corpo, fomentando uma educação que, ao invés de se contrapor à barbárie, a privilegia. Os resultados revelam ainda a presença de produtos para o consumo do lazer que informam, de antemão, a sequência de operações a reproduzir, exigindo gestos e ações automatizadas que preceituam a aridez da imaginação.
The work results from an ethnographic research carried out in a daycare center of the public school system of Florianópolis (SC). The data were analyzed considering the "didactic time" - recommended by the legislation -, structured in a routine comprising various moments: arrival, cleaning, feeding, sleep, playground, guided activity, departure. Inspired by issues from the Critical Theory of Society, the present text deals with the playground moments, considered as "privileged situations for education", both in the teachers' discourses and in the actions that distinguish these moments from the others, establishing a kind of opposition between "work time" and "free time". In such relation, apart from being regarded as periods to renew energies for the other activities, these moments offer an excuse to suspend the closer following up of activities by the teachers: the look of the grown up "will need" only to steer children clear of inadequate places or to avoid "exposed" wounds, shaping a group of socio-sanitary practices around the vital needs, and that contribute to eliminate deviances and differences in pursuit of pseudo-gratifications. The absence of a more careful approximation will also leave children to an ambiguous "spontaneity", subjected to the violence that produces scars, mainly on the body, and which promote the kind of education that privileges barbarism instead of opposing it. The results show also the presence of products for the consumption of leisure that inform beforehand the sequence of operations to be reproduced, requiring automated gestures and actions that stimulate the barrenness of imagination.