Resumo: O objetivo deste ensaio é resgatar as provocações, a lucidez e os impasses da consciência crítica demolidora de Ele, o personagem imoralista e cínico do diálogo O sobrinho de Rameau, de Denis Diderot, ressaltando dois aspectos da sua radicalidade filosófica e, sobretudo, ética: 1) tendo em mente o atual contexto histórico de trevas e perplexidade moral, no Ocidente, junto com Ele, o sobrinho de Rameau, indagar mais uma vez a Eu, o seu interlocutor iluminista, isto é, pretensamente esclarecido e cheio de convicções morais e certezas filosóficas, se valeu a pena para Sócrates, uma referência importante para o pensamento das Luzes na questão moral, ter escolhido os seus princípios nobres, mesmo ao custo da cicuta, em vez dos preconceitos da vida como ela é, ou melhor, se o célebre sábio grego teve algum benefício, ao ter optado pela ética e pelo conhecimento, e não pela indiferença e pela ignorância, num mundo cada vez mais determinado por apetites cegos à verdade e à virtude; 2) pensar a postura niilista do sobrinho, não só como uma sabedoria, como uma arte de viver, como uma técnica de sobrevivência em tempos hiperindividualistas, mas como um paradigma de liberdade, a despeito de suas consequências práticas.
Abstract: The purpose of this essay is to take some provocations, the lucidity and the deadlocks of the demolishing critical conscience of He, the immoralist and cynical character of the dialogue Rameau’s Nephew, of Denis Diderot, highlighting two aspects from his philosophical radicality and, above all, ethical: 1) keeping in mind the current historical context of darkness and moral perplexity in the West, along with He, Rameau’s nephew, inquire once more I, his illuminist interlocutor, i.e., pretentiously enlightened and full of moral convictions and philosophical certainties, if it was worthwhile for Socrates, an important reference for the thought of the Lights when it concerns to the moral question, to have chosen his noble principles, even at the cost of hemlock, instead of the prejudices of life as it is, or rather, if the wise celebrated Greek had any benefit by having opted for ethics and knowledge, and not by indifference and ignorance, in a world increasingly determined by blind appetites to truth and virtue; 2) thinking about the nephew’s nihilist posture not only as a wisdom, as an art of living, as a survival technique in hyperindividualistic times, but also as a freedom paradigm despite of its practical consequences.