Na segunda parte do romance As afinidades eletivas, a jovem Ottilie registra em seu diário as seguintes palavras: "Digno de veneração é apenas o naturalista que sabe descrever e expor o mais estranho, o mais insólito, com sua cor local, com todo o seu entorno e sempre em seu elemento mais próprio. Como eu gostaria de ver-me um dia na presença de Humboldt, ouvindo suas narrações!". A passagem revela, ao lado da admiração de Goethe por Humboldt, o seu interesse pelas ciências naturais, o qual experimenta significativa intensificação em setembro de 1824, quando estabelece contato pessoal com o botânico Carl F. P. von Martius. Em seu jovem interlocutor Goethe logo reconhece as qualidades de naturalista que no romance são atribuídas a Humboldt. Passa então a acompanhar com máximo interesse as publicações em que Martius elabora as pesquisas, observações e experiências realizadas ao longo dos três anos e meio em que percorreu, junto com o zoólogo Spix, mais de dez mil quilômetros de território brasileiro. Nasce assim um intercâmbio científico e cultural dos mais fecundos, o qual se enraíza especialmente nas concepções panteístas de que partilhavam o velho poeta de Weimar e o jovem botânico. Além de enfocar alguns aspectos das viagens brasileiras de Martius, este ensaio tem por objetivo expor a sua recepção por Goethe e discutir ainda eventuais influxos sobre sua produção literária. A reelaboração, em 1825, de uma das canções que Goethe, 43 anos antes, havia redigido com o subtítulo Brasilianisch deve-se seguramente a esse intercâmbio. Pretende-se discutir também a hipótese de que determinados textos e concepções de Martius tenham deixado vestígios em passagens da segunda parte do Fausto.
In the second part of the novel Elective Affinities, young Ottilie registered the following words in her diary: "The only inquirers into nature whom we care to respect, are such as know how to describe and to represent to us the strange wonderful things which they have seen in their proper locality, each in its own special element. How I should enjoy once hearing Humboldt talk!". Besides Goethe's admiration for Humboldt, this excerpt reveals his interest in natural sciences, which experienced significant intensification in September 1824 when Goethe established a personal contact with botanist Carl F. P. von Martius. In this young interlocutor, Goethe soon recognized the qualities of a naturalist which, in the novel, were attributed to Humboldt. He then developed a keen interest in and started to keep up with the publications in which Martius elaborated research, observations and experiments carried out throughout the three and a half years in which he travelled across more than ten thousand kilometers of Brazilian territory together with zoologist Spix. Thus, a most fruitful scientific and cultural exchange arose, rooted mainly in the pantheistic conceptions shared by Weimar's old poet and the young botanist. In addition to focusing on some aspects of Martius's expeditions in Brazil, the present essay aims to expose the reception given to them by Goethe and discuss occasional influxes in his literary production. The reelaboration, in 1825, of one of the songs Goethe had written 43 years earlier with the subtitle Brasilianisch is certainly due to this exchange. We also aim to discuss the hypothesis that certain texts and conceptions by Martius have left marks on passages in the second part of Faust.