Entre os milhões de brasileiros que atualmente residem no exterior, cerca de 5 mil são jogadores de futebol atuando em instituições reconhecidas, os clubes de futebol. O artigo aborda em uma perspectiva antropológica os processos migratórios desses jogadores brasileiros com carreiras de sucesso no sistema futebolístico contemporâneo, buscando compreender as características dessa circulação mundial particular de pessoas e de dinheiro, que apresenta enorme impacto no mediascape (Appadurai, 1990): de todas as "exportações" e de todas as emigrações brasileiras ora em curso, a de jogadores de futebol é a que apresenta maior impacto simbólico, tanto aqui como lá. Abordo os projetos, consumos e estilos de vida desses jogadores a partir dos dados de etnografia realizada na Espanha (Sevilha) e na Holanda (Eindhoven), e da interlocução com mais de 40 jogadores brasileiros vivendo ou tendo vivido em países no exterior, em contatos realizados no Canadá (Toronto), Holanda (Almelo, Groningen, Alkmaar, Roterdã, Amsterdã), Japão (Tóquio), França (Lyon, Le Mans, Nancy, Lille), Mônaco, Bélgica (Charleroi) e também no Brasil (Fortaleza, Salvador, Belém). Exploro as intersecções com idade, origem social e religião, constatando a forte presença de caçulas entre os jogadores (o caçulismo), a proveniência majoritária de camadas sociais subalternas e a adesão predominante a cultos evangélicos. Constato também uma crescente juvenilização desse fluxo emigratório. Concluo que a constante troca de instituição de trabalho ("clube" ou "clube global"), de países e o grande número de "repatriados", caracterizam como uma circulação esse movimento migratório: é o "rodar" de que falam os jogadores, atribuindo a essa noção um valor positivo de propiciar experiência. Essa circulação dá-se em zonas protegidas, onde um nacionalismo banal (Billig, 1995) é constantemente ativado. Mesmo depois da obtenção da cidadania legal continuam sendo vistos e percebendo-se como estrangeiros; a nacionalização tem assim um propósito estratégico (Sassen, 2008). Concluo que cruzam fronteiras geográficas sem ingressarem em países, pois suas fronteiras são os clubes e não os países.
Of the millions of Brazilians who currently live abroad, nearly 5 thousand play football in the world's top clubs. This article draws on the anthropological perspective to analyse the migration of these successful Brazilian players in order to understand the characteristics of this particular global circulation of people and capital which has a huge presence in the mediascape (Appadurai, 1990). Of all 'exports' and emigrations currently underway, that of football players has the greatest symbolic impact, both in Brazil and abroad. As the brain drain resulting from the emigration of scientists, this could be framed as an instance of 'fleeting feet'. I look at the plans, consumption and lifestyle of these players based on ethnographic data gathered in Seville, Spain and Eindhoven, Holland, as well as through conversations with more than 40 Brazilian players living or trying to live in foreign countries. These contacts took place in Toronto, Canada; Almelo, Groningen, Alkmaar, Rotterdam, and Amsterdam in Holland, Tokyo, Japan; Lyon, Le Mans, Nancy and Lille in France, Monaco; Charleroi, Belgium; and in Fortaleza, Salvador and Belém, Brazil. I explore the intersections of age, social origin and religion, and note that many of the players were the youngest siblings in their families. The large majority are low income, and attend evangelical churches. I also found that these immigrant athletes are increasingly younger. I conclude that the constant change of employer (club or global club), countries and the large number of 'repatriates' characterise this migratory movement as a circulation. It is what the players call 'rodar', cast positively as an opportunity for amassing experience. This circulation takes place in protected zones, where a banal nationalism (Billig, 1995) is constantly activated. Even after obtaining legal citizenship, they continue to be seen and to perceive themselves as foreigners. In this case, therefore, nationalisation has a strategic purpose (Sassen, 2008). I conclude that these players cross geographic borders without really entering the countries, because their borders are not national but those of the clubs.