Resumo Introdução: O aborto espontâneo é muito comum e o seu impacto nas famílias, na sociedade e nos serviços de saúde é comprovado, mas subestimado. Este relato de caso pretende realçar a importância do acompanhamento após um aborto espontâneo, no luto, nos sintomas psicológicos associados à perda gestacional e na orientação holística do casal. Descrição do caso: Mulher de 37 anos, natural do Nepal, engravida espontaneamente após múltiplas tentativas sem sucesso. Sofre um aborto espontâneo às 10 semanas de gestação e é avaliada pela sua equipa de família, manifestando sentimentos de tristeza, solidão, ansiedade e medo, e desorientação face aos cuidados necessários. O acompanhamento centrou-se no esclarecimento de dúvidas e mitos, no reconhecimento dos sentimentos do casal, na exploração das formas de expressão do luto na cultura de origem, nos ensinos para estimular mudanças de comportamentos e na capacitação para o planeamento de uma nova gravidez. Comentário: Não existem intervenções farmacológicas eficazes para prevenir o aborto espontâneo; contudo, é uma oportunidade para intervir na adoção de hábitos de vida mais saudáveis. Apesar de frequentes, as consequências psicológicas e a psicopatologia associadas ao aborto espontâneo são muitas vezes esquecidas. A experiência do luto é individual e não se baseia necessariamente na idade gestacional, no nível socioeconómico ou educacional, ou no número de perdas ou de filhos vivos. Lidar com este caso exige à medicina geral e familiar avaliar a gestão do luto e o bem-estar físico e mental, despistando psicopatologia e acompanhando o planeamento de uma gravidez futura, atuando em cuidados transculturais e na dimensão social e familiar de cada um.
Abstract Introduction: Miscarriages are common and their impact on families, societies, and health services are proven, but yet underestimated. This case report intends to highlight the importance of follow-up after a miscarriage, especially concerning grief, psychological symptoms associated with pregnancy loss, and the holistic approach to the couple. Case report: A 37-year-old woman from Nepal becomes pregnant spontaneously after multiple unsuccessful attempts. She suffers a miscarriage at 10 weeks of gestation and she is seen by her family doctor and nurse. She expresses feelings of sadness, loneliness, anxiety and fear, and confusion regarding the follow-up care. The process of care focused on clarifying doubts and myths, recognizing the couple's feelings, exploring ways of expressing grief in their culture, encouraging changes in behavior, and helping to plan a new pregnancy. Discussion: There are no effective pharmacological interventions to prevent miscarriage, despite being an opportunity to promote the adoption of healthier lifestyle habits. Although frequent, the psychological consequences and psychopathology associated with miscarriage are often overlooked. The experience of bereavement is individual and it is not necessarily related to gestational age, socioeconomic or educational background, or the number of losses or living children. Dealing with a case of miscarriage requires family physicians to assess grief management and physical and mental well-being, screening for psychopathology and following the planning of a future pregnancy, acting on cross-cultural care and social and family dimensions of each person.