Resumo O espaço público é a estrutura, o esqueleto espacial da cidade (Sòla-Morales, 1997). É o lugar de partilha, de encontro do colectivo (Gehl, 1971), da liberdade democrática; é o espaço que sedimenta o habitat urbano. Ainda assim, é no espaço limite entre público e privado que se estabelecem algumas tensões espaciais que configuram o modo como vivemos a cidade. A habitação comum é, por outro lado, a matéria construída que dá, silenciosamente, corpo à estrutura da cidade, face ao protagonismo do espaço público (Monteys, 2013; Serpa, 2015). É sobre os espaços in between que tendências actuais de pensamento arquitectónico reflectem sobre o valor da ambiguidade espacial enquanto produtora de porosidades que reconfiguram os limites e os modos de apropriação e permanência no espaço público e privado (Monteys, 2010), recuperando a memória conceptual da planta de Roma de Nolli (1748). Os espaços de transição surgem como complemento, por um lado ao espaço público reinterpretando reflexões teóricas apontadas no Movimento Moderno e pelo grupo Team 10 na década de 1960 (Hertzberger, 1991), por outro lado ao espaço privado, como prolongamento da casa, redefinindo os limites da domesticidade (PLOT 50, 2019). O artigo procura, então, reflectir sobre a relevância dos espaços de transição em edifícios habitacionais colectivos e como estes podem contribuir para a construção de sistemas de continuidade espacial entre o urbano e o doméstico. Tendo como enquadramento Portugal e os casos desenvolvidos em projectos de investigação como “Tipologia Edificada” e “Entre Habitação e Cidade”, pretende-se decompor morfologicamente os sistemas de permanência e distribuição (Boettger, 2014) de edifícios de habitação, interpretando-os como um limiar espesso onde se habita (Van Eyck, 1962). Procura-se abrir o debate na produção arquitectónica sobre a importância destes sistemas como dispositivos de transição, mas também, enquanto estruturas de articulação e dilatação do espaço público (Schmid, 2019) e doméstico que activam o habitat, tornando-o mais integrado e contínuo.
Abstract Public space is the structure, the spatial frame of the city (Sòla-Morales, 1997). It is the place of sharing, of collective meeting (Gehl, 1971), of democratic freedom; it is the space that sediments the urban habitat. Even so, it is in the limit space between public and private that some spatial tensions are established that shape the way we live in the city. Common housing is, on the other hand, the built matter that silently embodies the structure of the city, given the protagonism of public space (Monteys, 2013; Serpa, 2015). It is on spaces in between that current trends in architectural thought reflect on the value of spatial ambiguity as a producer of porosities that reconfigure the limits and modes of appropriation and permanence in public and private space (Monteys, 2010), recovering the conceptual memory of Nolli’s plan of Rome (1748). The transition spaces appear as a complement, on the one hand to the public space, reinterpreting theoretical reflections pointed out in the Modern Movement and by the Team 10 group in the 1960s (Hertzberger, 1991), on the other hand to the private space, as an extension of the house, redefining the limits of domesticity (PLOT 50, 2019). The article therefore seeks to reflect on the relevance of transition spaces in collective housing buildings and how they can contribute to the construction of systems of spatial continuity between the urban and the domestic. Taking Portugal as a framework and the cases developed in research projects such as “Building Typology” and “Between Housing and the City”, it is intended to morphologically decompose the permanence and distribution systems (Boettger, 2014) of residential buildings, interpreting them as a thick threshold where one inhabits (Van Eyck, 1962). The aim is to open the debate in architectural production on the importance of these systems as transition devices, but also as articulation structures and expansion of public (Schmid, 2019) and domestic space that activate the habitat, making it more integrated and continuous.