RESUMO Trata o presente artigo de um estudo sobre o modo como Merleau-Ponty busca extrair, da teoria freudiana dos sonhos, consequências ontológicas concernentes à vinculação expressiva entre as diferentes dimensões da experiência onírica, especificamente sobre o papel dos restos diurnos na descarga da libido, na realização do simbolismo ou, o que é a mesma coisa, na conversão do simbolismo em algo narrativo e sensível, especificamente afetivo. Conforme se mostrará, para Merleau-Ponty, seja no sonho sonhado seja no sonho relatado podemos verificar, entre a dimensão imaginária (afetiva e narrativa) introduzida pelos restos diurnos, por um lado, e a dimensão simbólica (ou inconsciente) expressa como significante esquecido, por outro; uma sorte de unidade sem coincidência, uma indivisão meramente expressiva. A pergunta deste artigo é ‒ do ponto de vista ontológico ‒ de que modo a indivisão expressiva entre o sonhado e o relatado dispensa o recurso à ideia de uma interioridade transparente?
ABSTRACT This article deals with a study on how Merleau-Ponty seeks to extract, from Freud’s theory of dreams, ontological consequences concerning the expressive link between the different dimensions of the dream experience, specifically on the role of daytime remains in the discharge of libido, in realization of symbolism or, what is the same thing, in the conversion of symbolism into something narrative and sensitive, specifically affective. As it will be shown, for Merleau-Ponty, whether in the dreamed dream or in the reported dream, we can verify between the imaginary dimension (affective and narrative) introduced by the daytime remains, on the one hand; and the symbolic (or unconscious) dimension expressed as a forgotten signifier, on the other; a sort of unity without coincidence, a merely expressive indivisibility. The question of this article is - from an ontological point of view - how does the expressive division between the dreamed and the reported dispense the recourse to the idea of a transparent interiority?